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Uma das prioridades da presidência brasileira no G20, o debate sobre desenvolvimento sustentável colocará em pauta durante a cúpula de chefes de Estado, em novembro, no Rio, temas como transição energética e combate a mudanças climáticas. Há diversos estudos em andamento no Brasil com foco, por exemplo, em descarbonização e energias renováveis.

A fim de oferecer uma perspectiva científica às autoridades que estarão reunidas no Rio, o S20 — grupo de engajamento do G20 para a área de ciência e tecnologia, formado pelas academias nacionais de ciências dos países-membros do G20 — formulou uma série de recomendações sobre o processo de transição energética.

Entre elas, estão a utilização de fontes de energia oceânica para geração de eletricidade; a implementação de processos de reciclagem em sistemas de energia renovável para torná-las mais limpas e sustentáveis; e o emprego de biocombustíveis e hidrogênio, sobretudo no setor de transportes e na indústria pesada.

— A ciência tem domínio sobre diversas possíveis soluções para a transição energética. Mas elas precisam ser economicamente viáveis e dependem de políticas governamentais, investimentos de empresas e aceitação da população para serem implementadas. Então, os países têm que sinalizar em que direção querem ir, porque isso estimula a indústria a caminhar no mesmo sentido e colocar dinheiro em pesquisas, além de mobilizar as pessoas para a construção de uma sociedade rumo ao futuro que foi delineado — analisa o coordenador da força-tarefa Transição Energética do S20, Alvaro Prata, que também é diretor da Academia Brasileira de Ciências (ABC), diretor-presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Um campo de estudo ainda recente é o das energias renováveis do oceano. Ondas, marés, correntes, os gradientes de salinidade e térmico da água (variação de temperatura entre a superfície e uma determinada profundidade) servem de recursos para a geração de eletricidade, a partir da instalação no mar de tecnologias de conversão de energia.

Energia das ondas

O espaço marinho também pode ser aproveitado para a construção de usinas eólicas e solares offshore, com sistemas flutuantes onde se colocam turbinas eólicas que aproveitam ventos mais constantes e intensos, ou painéis solares com placas de maiores dimensões.

Pesquisadores do Grupo de Energia Renovável no Oceano (GERO), vinculado ao Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Coppe/UFRJ, estão à frente de um projeto que visa instalar uma planta-piloto de conversão de energia das ondas em eletricidade na Ilha Rasa, localizada no litoral da Zona Sul carioca, próximo às Ilhas Cagarras. A capacidade será de 50 kW.

Experimentos laboratoriais já foram concluídos. Agora estão sendo coletados dados nos arredores da ilha.

— Em termos mundiais, essa tecnologia está em fase pré-comercial, de construção de protótipos e demonstrações. Quem conseguir dominá-la fará avanços muito grandes, porque trata-se de uma energia limpa e renovável. As empresas que mais têm mostrado interesse nessas inovações são as de óleo e gás, que querem descarbonizar suas operações — diz Segen Estefen, coordenador do GERO e diretor-geral do Instituto Nacional de Pesquisas Oceânicas (INPO).

Em outro projeto de pesquisa, em parceria com uma petrolífera chinesa, está sendo desenvolvida uma estrutura flutuante para comportar uma usina eólica em alto-mar, com capacidade de geração de 15 MW em áreas onde a profundidade ultrapassa mil metros.

A ideia é que a unidade, em caso de aplicação comercial, possa suprir a demanda de eletricidade em campos de petróleo offshore. A preparação dos modelos para testes deve começar no segundo semestre de 2025.

Segundo Estefen, também é possível construir usinas de conversão em profundidades menores e usar as energias renováveis do oceano para alimentar a rede de distribuição de energia no continente, fornecendo eletricidade para a população em geral.

— A maior vantagem das energias renováveis do oceano é que elas são democráticas. Diversos países podem fazer uso porque o mar oferece essa possibilidade. O desafio é torná-las economicamente viáveis. Cientificamente, estamos em uma fase de agregação de tecnologias e otimização de processos para que elas tenham um custo mais competitivo — diz o pesquisador.

No Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI, na sigla em inglês), sediado na Universidade de São Paulo (USP), um projeto pioneiro de produção de hidrogênio renovável a partir de etanol entrará em fase de testes nas próximas semanas. A ideia é fazer uma prova de conceito, usando o gás como combustível para um ônibus e dois carros que circularão pelo campus.

Coordenador da pesquisa, o diretor-científico do RCGI, Julio Meneghini, explica que o hidrogênio tem enorme potencial em transportes. Automóveis movidos a hidrogênio precisam de uma quantidade menor de baterias do que os elétricos convencionais, o que os torna mais leves. E o abastecimento com o gás pode ser feito em apenas cinco minutos, enquanto um carro elétrico leva cerca de oito horas.

Preocupados com os resíduos na transição, pesquisadores do Grupo de Pesquisa Estratégica em Energia Solar (Fotovoltaica) da UFSC desenvolveram uma solução que permite reutilizar baterias descartadas de carros elétricos. Os cientistas estudaram um jeito de reaproveitar as baterias em sistemas estacionários de armazenamento de energia (ou seja, que não precisam se mover).

As baterias descartadas ganham uma segunda vida em diversas aplicações, como refrigeradores de vacinas contra a Covid-19 usados em regiões da Amazônia sem luz.

Reúso de baterias

Na solução dos pesquisadores, em teste há cerca de um ano, as baterias de lítio que seriam descartadas armazenam energia solar durante o dia para ser empregada na recarga dos carros, o que não só viabiliza como barateia o processo.

— O Brasil precisa estimular mais pesquisas e capacitar recursos humanos. Investimentos em ciência e tecnologia são importantes para que o país participe do processo de transição energética não só como consumidor de inovações tecnológicas, mas também como desenvolvedor delas — afirma Ricardo Rüther, professor da UFSC e coordenador do Fotovoltaica. * Camilla Muniz - Do Valor

Fonte: O Globo
Seção: Indústria & Economia
Publicação: 25/10/2024

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