
Especialistas consultados pelo Valor dizem que
ainda é cedo para se ter certeza sobre os efeitos completos do aumento
tarifário sobre o aço brasileiro. Mas citam uma série de desdobramentos
possíveis, a depender da eficácia do tarifaço aplicado pelo governo Donald
Trump sobre as importações americanas. Entre as possíveis consequências para o
Brasil, estão o aumento da disponibilidade interna de aço, impacto sobre o
Produto Interno Bruto (PIB) e sobre as exportações brasileiras. Ainda assim, o
momento é de espera, uma vez que os países ainda devem negociar condições para
tentar alterar as alíquotas impostas pelos EUA.
As tarifas de 25% sobre importações de aço e alumínio dos
Estados Unidos iniciaram à meia-noite desta quarta-feira (12) a todos os
parceiros comerciais, como Brasil, México, Canadá, Alemanha, Japão e Coreia do
Sul.
A União Europeia anunciou que vai impor contra-medidas às
novas taxas dos Estados Unidos, com planos de impor até € 26 bilhões (US$ 28
bilhões) sobre produtos americanos. Os europeus terão como alvo produtos
politicamente sensíveis em Estados liderados pelos republicanos, como a soja da
Louisiana, segundo um alto funcionário da União Europeia.
O vice-presidente do conselho do Centro Brasileiro de
Relações Internacionais (Cebri) e principal negociador comercial brasileiro
entre 1998 e 2002, embaixador José Alfredo Graça Lima, disse que o aço e o
alumínio são produtos que estão periodicamente sujeitos a medidas para
sustentar preços nos EUA, uma vez que a indústria siderúrgica americana está em
“crise permanente porque se tornou pouco competitiva em relação aos demais
produtores, especialmente a China”.
Ele ressalta que o Brasil exporta para os EUA principalmente
placas e tarugos, semiacabados importantes na cadeia automotiva e nas obras públicas.
“O comércio Brasil-Estados Unidos é de operações intrafirmas, exemplo de
complementaridade que dá certo e é confortável para os americanos”, diz Graça
Lima, que pondera que, do ponto de vista operacional, o governo brasileiro deve
manter conversas para reverter aumentos tarifários. “Acredito que conversas
estejam em curso”, pondera o diplomata, acrescentando que a pauta de costumes
fica mais visada e atende a determinados setores que não estão preocupados com
a economia. “Mas é ela [a economia] que prevalece.”
Graça Lima diz que “dificilmente” o aço brasileiro que
porventura deixar de ser exportado para os EUA encontrará outros mercados
externos. Um efeito possível, diz, é o aumento da oferta de aço no Brasil, com
efeito nos preços. “Pode ter redução do preço do aço internamente. Têm leituras
mistas. Não é bom para a indústria, mas pode ser bom para a cadeia.” Ele também
considera “provável” que aumente a presença do aço chinês no Brasil, caso os
EUA sejam bem-sucedidos em evitar a triangulação em outros países.
Para Larissa Wachholz, sócia da Vallya Participações e
especialista de Ásia do Cebri, por ora, os países que mais exportam aço para os
americanos estão em pé de igualdade de competição, com a mesma tarifa sobre
todos eles. Na visão dela, os desdobramentos vão depender da capacidade de
negociação entre esses países e os Estados Unidos: “Vemos que vários países têm
repensado a forma como respondem à tarifação, o que tem feito os americanos
mudarem de posição”.
Em relação ao Brasil, Wachholz diz que os americanos devem
estar abertos a negociar, uma vez que o aço brasileiro é importante para os
EUA. “O produto brasileiro vai diretamente para a fabricação de bens
importantes, como carros, ou para fomentar o mercado imobiliário. São setores
diretamente relacionados ao custo de vida das pessoas. Se as tarifas forem
muito altas, elas não serão absorvidas pela indústria sem serem repassadas aos
consumidores.”
O Instituto Aço Brasil disse, em nota, que têm expectativa
de diálogo do governo brasileiro com o americano para restabelecer bases do
sistema de importação do primeiro governo Trump, em 2018. Na ocasião,
importações de aço brasileiro mantiveram-se isentas de imposto, desde que
respeitadas as cotas de entrada de 3,5 milhões de toneladas de semiacabados e
687 mil toneladas de laminados por ano. “A negociação de 2018 atendeu não
somente o interesse do Brasil em preservar o acesso a seu principal mercado
externo do aço, mas também o da indústria de aço dos Estados Unidos.”
As tarifas de 25% sobre as importações de aço pelos EUA
devem ter efeito “insignificante” na economia brasileira como um todo, mas
levar a uma queda de 11,27% nas exportações brasileiras de metais ferrosos e a
uma perda equivalente a US$ 1,5 bilhão, conforme estimativa do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), de autoria do pesquisador Fernando Ribeiro. A medida
deve representar 0,01% a menos no PIB brasileiro, mesma influência prevista
para ocorrer nas economias do Canadá e do México. As exportações brasileiras
totais, por sua vez, podem cair 0,03%, enquanto o efeito nas importações seria
mais intenso, de -0,26%, por causa da redução na atividade econômica. O estudo
do Ipea também estima os efeitos das novas tarifas para a economia dos Estados
Unidos. A projeção é de um efeito negativo de 0,02% no PIB americano; 0,49% nos
investimentos; 0,39% nas exportações e 0,66% nas importações.
Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, afirma que
entre as poucas certezas por enquanto está o fato de que a imposição de tarifas
a parceiros terá efeitos na inflação. “Os Estados Unidos importam cerca de 25%
do aço que consomem. Existe um peso grande de se cortar essa importação toda,
mas ainda é cedo para sabermos qual o peso disso. Trump poderia estar
discutindo aspectos que traria benefícios para a economia americana.”
Fonte: Valor
Seção: Siderurgia & Mineração
Publicação: 13/03/2025